Quem prega a avaliação de trabalhos sem o maniqueísmo futebolístico que só reconhece virtudes nos vencedores teve, por coerência, que compreender as razões da decisão que impediu a continuidade de Dorival Júnior como técnico do Flamengo . Ao salvar a temporada de 2022 com os troféus das copas, Dorival cumpriu a missão que lhe foi entregue e deveria, em tese, ter sua permanência estendida automaticamente pelo simples alcance de objetivos. E embora o desempenho do time que ele desenhou com o diamante no meio de campo e Pedro e Gabriel juntos tenha sofrido nas partidas finais de ambos os torneios, houve instantes de brilho que até evocaram o encantamento de 2019. A última imagem, porém, pareceu decisiva para que as pessoas que comandam o departamento de futebol do Flamengo tomassem outra direção.

O argumento de que “não basta ganhar, é preciso jogar bem” é tão belo quanto controverso. A alguns soa como apelo ao romantismo, coisa de quem não vive o futebol como competição e o converte em produto da própria imaginação. Mas foi exatamente a mensagem que a diretoria do Flamengo passou ao trocar Dorival por Vitor Pereira - este de um curtíssimo reinado, que, para os que acreditam, pode servir como carma - e apostar numa mudança de métodos, mesmo com pouquíssimo tempo para estabelecê-los, como passaporte para a conquista dos títulos que o clube disputaria no início de 2023. O problema, ou um deles, é que o argumento pode encobrir os erros de uma análise equivocada como, por exemplo, a ideia de que Dorival não tem a grife necessária para dirigir um elenco como o do Flamengo, nonsense propagado pelas redes antissociais no encerramento do ano passado.

Que o Flamengo esteja diante da necessidade da salvação de mais uma temporada, e que a saída de Jorge Sampaoli - que agregou pouco mais do que grife até agora - seja ponderada como meio para vencer uma decisão contra um time treinador por... Dorival Júnior são fatos que compõem uma história dramática, como um videotape de episódios que se apresentam em loop, obrigando o clube a reviver os próprios erros e concluir, enfim, que é tarde. O calendário está se esgotando; o Mundial, a Supercopa, a Recopa, o Estadual e a Libertadores já foram, o Campeonato Brasileiro parece um incômodo que se renova a cada rodada, e a Copa do Brasil pode ficar com o treinador a quem o Flamengo agradeceu pelos serviços prestados, os títulos conquistados e desejou boa sorte na sequência da carreira.

Ao que parece, o trabalho estacionou. E independentemente das opiniões sobre os jogadores do Flamengo - se são primas-donas saciadas pela própria vaidade ou criaturas geradas por um departamento de futebol que entrou em colapso -, é da capacidade de mobilização deles que depende a última oportunidade de conquista num ano que, mesmo com a Copa do Brasil, não tem como deixar boas sensações. O caso de agressão de um membro da comissão técnica a Pedro poderia até ser bem processado coletivamente e conduzido à completa cicatrização, se tivesse sido uma anomalia, uma explosão de insanidade à qual todo ser humano pode sucumbir. Ocorre que foi, ao mesmo tempo, sinal e comprovação de uma defeituosa gestão de pessoas, pecado que nenhum treinador que se considere de ponta pode cometer. Não seria exagero dizer que a decisão de dispensar Sampaoli já foi tomada. O que ainda não se resolveu é a data.

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