Há exatamente um mês, no dia 22 de abril, Matheus Bachi usou as redes sociais para comunicar que o técnico Tite, de quem é filho, estava anunciando "uma pausa na carreira por tempo indeterminado para cuidar de sua saúde mental e física". A decisão interrompeu a negociação para um possível retorno do profissional ao Corinthians e deixou claro: treinadores de futebol não são heróis nem robôs. "Entendi que existem momentos em que é preciso compreender que, como ser humano, posso ser vulnerável e admitir isso certamente irá me tornar mais forte", escreveu Tite, à época. Não é comum um treinador manifestar, de forma pública, preocupação com a saúde mental.
A forma como o futebol brasileiro lida com o assunto -- ou deixa de lidar -- ainda é controversa. Um artigo da CBF Academy, responsável por emitir licenças para técnicos atuarem no Brasil, dá uma dica a quem quer começar na profissão. "Aprender a conviver com a pressão: pressão externa por resultados, interna por escalar certos jogadores, pressão dos jogadores que desejam uma vaga no time, enfim, pressão de todos os lados", diz um trecho. A pressão, no entanto, nem sempre é saudável.
Dorival Júnior, ex-técnico da seleção brasileira e responsável por assumir o comando do Corinthians após a recusa de Tite, pediu atenção à saúde mental dos comandantes. "O nível de cobranças e preocupações de um profissional do futebol é muito alto. As pessoas às vezes não têm ideia do que isso provoca", disse, em entrevista coletiva, quando foi apresentado no clube paulista. "É uma atenção que deveríamos dar de maneira diferente, para preparar um pouco mais nossos atletas e profissionais, porque a carga é muito pesada", seguiu.
Juliane Fechio, psicóloga do Santos por quase uma década, explicou que ter saúde mental significa ter bem-estar físico, social e psicológico e que é crucial para os treinadores conseguirem gerenciar suas emoções de forma equilibrada e saudável. Durante as últimas semanas, a ESPN enviou um formulário para ser preenchido de forma anônima pelos 20 técnicos da Série A do Brasileirão. Do total, nove responderam, e apenas um admitiu passar por acompanhamento psicológico de forma pessoal. Dois deles disseram já ter feito acompanhamento psicológico dentro do clube, e dois treinadores responderam que já foram diagnosticados com estresse e/ou ansiedade.

A antropóloga e jornalista Mariana Mandelli destacou que no ambiente masculinizado do futebol, admitir questões de saúde mental pode ser interpretado como sinal de fraqueza, o que dificulta a abertura sobre o tema. Além disso, a pressão externa sobre os treinadores os leva a desenvolver uma casca, evitando aprofundar questões pessoais e impedindo-os de demonstrar fraqueza, como explicou Paulo Ribeiro, psicólogo do Flamengo.

A falta de cuidado com a saúde mental dos treinadores pode impactar negativamente o desempenho das equipes, já que um treinador desequilibrado emocionalmente reflete diretamente no comportamento do time. Por isso, é fundamental que o tema da saúde mental no futebol seja discutido abertamente, para que os treinadores sintam-se à vontade para pedir ajuda e quebrar o estigma em torno do assunto. Além disso, a presença de profissionais de psicologia nos clubes é essencial para oferecer suporte emocional aos treinadores. A CBF Academy inclui a disciplina de Psicologia do Futebol em seu curso de formação e qualificação de treinadores, mostrando a importância crescente do tema no mundo do futebol.
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