Às moscas: público de 2.487 de Fla x Madureira deixou o Maracanã vazio (Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo)
Bola rolando, arquibancadas vazias. O casamento entre futebol e torcida vive uma crise de relacionamento no Campeonato Carioca. Desde o último estadual, a presença dos torcedores nos estádios do Rio de Janeiro está sendo baixa. E este ano o fato chamou a atenção de todos.
Clubes e a federação de futebol do estado já tocaram no assunto, seja para reclamar ou pedir mudanças no campeonato, que este ano mudou a fórmula de disputa devido ao menor número de datas disponíveis no calendário em função da paralisação para a Copa do Mundo. O tradicional formato com finais de turno foi trocado por pontos corridos seguidos da decisão mata-mata.
Nem mesmo a reabertura do Maracanã se tornou um grande atrativo, e a média de público na atual edição do torneio, após as 15 rodadas da Taça Guanabara, é de 2.144 pagantes por jogo.
Número bem próximo dos 2.396 pagantes de toda a competição em 2013, que teve o agravante da interdição do Engenhão no meio do torneio e fez do Raulino de Oliveira, em Volta Redonda, o principal palco da Taça Rio na época. Se não forem contados os seis jogos das semifinais e finais de turno, a média da temporada passada cai ainda para 1.789 pagantes por partida.
O Carioca atual, se comparado à primeira fase dos outros principais estaduais do país, só está à frente do Campeonato Gaúcho, que teve média de 1.666 pagantes. O Mineiro levou em média 3.106 torcedores por partida, enquanto no Paulista o número foi de 4.964.
De acordo com um levantamento feito pelo blog "Teoria dos Jogos", 61 jogos do estadual do Rio, mais da metade dos 120 disputados até aqui, tiveram plateias inferiores a 500 pagantes. Dos grandes clubes da cidade, o Vasco foi o único a não jogar nenhuma vez para menos de mil pagantes; o Fluminense fez isso duas vezes, o Flamengo, três, e o Botafogo, quatro. Os dois últimos utilizaram muitas vezes equipes formadas por reservas para priorizar a Libertadores: o Rubro-Negro adotou o expediente em seis duelos, e o Alvinegro, em 11.
Com os públicos ruins e prejuízos nas rendas dos grandes, a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj) mudou a forma de divulgação dos borderôs em seu site oficial. A partir da oitava rodada do estadual, a federação passou a incluir no resultado final dos clubes o valor da cota líquida de TV, no valor de R$258 mil para cada partida de Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco. Com isso, as rendas após as partidas dos quatro não aparecem mais no vermelho.
Público de 308 pagantes de Bota x Nova Iguaçu, em Moça Bonita, foi o pior dos grandes (Foto: Marcio Alves/Agência Globo)
Diante deste cenário, a Ferj anunciou na semana passada a criação de fórum para discutir nos próximos meses a viabilidade de o estadual passar a ter só 12 clubes numa segunda fase, na qual entrariam os quatro grandes, a partir de 2016 - segundo o estatuto da entidade, mudanças no campeonato só podem ser feitas de dois em dois anos. Em entrevista recente à Rádio Globo, Rubens Lopes, presidente da Ferj, culpou outros fatores de responsabilidade dos clubes pelo baixo interesse do público.
- Dizer que estamos satisfeitos com o campeonato, evidente que não. O que me irrita é querer atribuir ao presidente da federação o resultado do campeonato, a expectativa de público. Primeiro que não é a federação que marca jogo para quarta-feira de cinzas às 22h em Volta Redonda, não é a federação que diz que vai escalar time reserva, não é a federação que estabeleceu a fórmula do campeonato, não foi a federação que estabeleceu nada referente a esse campeonato.
É a escassez de talentos, horários inadequados, dias inadequados, sem contar o fator segurança e a grande concorrência que a oferta de lazer compete bastante nessa época com o futebol... Concordo que o campeonato precisa ser estudado, revisto, discutido.
Fluminense, Flamengo e Vasco demonstraram insatisfação com o retorno de público do Carioca e chegaram a organizar uma espécie de oposição ao atual mandatário da Ferj nas eleições da federação, no dia 11 de março. Presidente do Tricolor desde 2010, Peter Siemsen explicou a postura do trio e cobrou mudanças para evitar medidas mais drásticas.
- Em toda a minha gestão, nos três primeiros anos, o público foi um problema. Uma hora por conta da logística do Engenhão, uma hora porque não tinha Engenhão e Maracanã. Tivemos uma decisão de turno em Volta Redonda no ano passado, é uma situação ruim. A culpa é da federação? Não. É de todos. Não nos preparamos depois do que aconteceu no ano passado. Os clubes precisam que a federação conduza esse tipo de mudanças.
É muito difícil atuar hoje, na estrutura política de regulamentos, CBF, Ferj e clubes. Só se os clubes, em nível de rebeldia maior, montassem ligas. Haveria enfrentamento de regras, funcionamento. Não seria bom para ninguém. A gente (Fluminense, Flamengo e Vasco) acordou, se uniu, vamos ter que propor soluções, tentando implementar, ainda que não ocorra alinhamento político, para evitar que a gente tenha que pensar em algo mais radical.
O Botafogo foi o único dos quatro grandes que não se posicionou contrário a Rubens Lopes na ocasião. Diretor executivo do clube, Sergio Landau também não se mostrou satisfeito com o campeonato, mas disse entender a situação que o futebol do estado enfrenta. O dirigente classificou o momento como atípico e está à espera dos debates no fórum criado pela Ferj.
- Foi um ano atípico, temos Copa do Mundo e um calendário ainda mais apertado. No caso do Botafogo, ainda temos a Libertadores. Foi uma séria de coisas. A federação já divulgou que vai criar um fórum de discussão para tentar analisar e propor melhorias - posicionou-se.
Em defesa do Rio, Rubens Lopes recentemente alegou que a queda de público está acontecendo em outras competições do país. O presidente da Ferj comparou como exemplo o total de público do Flamengo no ano do título do Campeonato Brasileiro com o Brasileirão de 2012.
- Isso é um fato que vem acontecendo em todo o país e em todas as competições. Em 2009 por exemplo, o Flamengo teve um público de 760 mil pagantes no Brasileiro. Em 2012, teve de 300 mil. Por outro lado, o preço dos ingressos influi diretamente na presença do público nos estádios. A oferta é muito grande, se tem futebol ofertado a todo momento. E o maior ticket médio dos estaduais do país é praticado pelo Flamengo nos jogos no Maracanã. E ele não está preocupado com isso. Estamos caminhando por um processo de elitização dos estádios de futebol.
No Fla-Flu da Taça Guanabara o ticket médio foi de R$ 80, mais que o da semifinal da Copa do Brasil do ano passado, contra o Goiás (R$ 68). Nos outros clássicos disputados pelo Rubro-Negro, o ticket médio caiu, mas não muito: em torno de R$ 64. Nenhum jogo deste Carioca até o momento chegou a ter 14 mil pagantes.
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