Simplesmente o melhor

2/5/2014 10:29

Simplesmente o melhor

Simplesmente o melhor
Convivi com Ayrton Senna durante uma temporada inteira da Fórmula-1. Foi em 1987, quando eu era correspondente do GLOBO na Europa: morava em Madrid e viajava para cobrir as corridas “in loco". Naquele ano, Nelson Piquet conquistou seu terceiro título, apesar de (que coincidência!) sofrer sério acidente no GP de San Marino, em Imola, a bordo de uma Williams, na Tamburello!

Nelson, porém, saiu praticamente ileso e acabou campeão. Mas o piloto mais badalado no final do campeonato já era Ayrton. Isso porque, numa transferência milionária, trocara a Lotus pela McLaren, onde, a partir de 1988, faria dupla com o francês Alain Prost, o “professor”.

Envolta em mistério e rumores dos mais variados, a transferência só se confirmou, de fato, numa entrevista exclusiva que Senna me deu no dia 26 de agosto e foi publicada pelo GLOBO, no caderno de esportes do dia 31 — o anúncio oficial aconteceu em 5 de setembro, em Monza, na véspera do GP da Itália. E, por causa desse “furo”, eu e ele brigamos.

Ayrton não queria admitir a mudança, antes do pronunciamento da sua futura escuderia. Mas concordou em falar comigo depois que, no dia 6 de agosto, na véspera dos treinos para o GP da Hungria, em Budapeste, a Lotus (sua equipe) surpreendeu a todos (inclusive a ele) com um comunicado de que contratara Nelson Piquet para o seu lugar. Ou seja: insinuou que Senna fora demitido — e não que a trocara para ter um carro mais competitivo.

Vinte dias depois, conforme o combinado com ele, no boxe da Lotus, no GP seguinte,em Zeltweg, na Áustria, desembarquei em Imola, para entrevistá-lo. Era uma sessão de testes, com poucos jornalistas presentes. Tínhamos combinado de jantar mas, ao me ver, Ayrton avisou que a conversa seria no almoço, pois à noite teria compromisso com patrocinadores. Nenhum problema pra mim, que vinha de Roma, onde estava cobrindo o Mundial de Atletismo, e poderia até retornar mais cedo.

Quando os motores pararam de roncar pela manhã, subimos a uma das salas de cima dos boxes e, enquanto ele comia, foi soltando cobras e lagartos e me contando toda a história:

— Mudei para ser campeão. O objetivo da Lotus é sobreviver, o meu é vencer. O dia em que não estiver mais a fim de ganhar, vou para casa. A vitória é o que importa na F-1. Eles (da Lotus) já sabiam que eu sairia, desde o GP da Alemanha, em Hockenhein. Armaram aquele circo todo em Budapeste para não passar por maridos traídos.

— É impossível ter amigos na F-1. O dinheiro que corre por trás é tão alto que ninguém quer saber de nada. Basta aparecer um piloto jovem, com talento, que todos querem derrubá-lo. O circo é nojento. Só continuo porque quero ser campeão do mundo. Quando parar, vou escrever um livro e muita gente vai ficar boquiaberto com as coisas que vou contar.

Àquela altura, quem já estava com o queixo caído era eu. E, em meio ao desabafo, Senna me deu vários detalhes de como seria a convivência com Prost:

— Não haverá primeiro piloto. O carro reserva estará sempre à disposição dos dois. A partir de agora, somente Lotus e McLaren usarão motor Honda e a Williams (então dominante) terá problemas...

Ao final, antes de voltar à pista, Ayrton disparou:

— Agora, você já sabe de tudo. Mas, olha: todo esse nosso papo é “off”... (ou seja, não é pra publicar).

— Como “off”? — contra-argumentei. Eu já avisara ao jornal que ia entrevistá-lo. E isso provocara uma viagem extra, com diária de hotel, passagem etc. Como voltar de mãos abanando, apenas com um papo em “off”? Para ser assim, não precisávamos ter marcado fora do calendário das corridas!

Contrariado, e sempre muito preocupado com a própria imagem, Ayrton condicionou a publicação à leitura prévia e à sua aprovação do texto. Recusei. Nunca submeti minhas entrevistas aos entrevistados e precisava voltar pra Roma, para seguir na cobertura do Mundial de Atletismo. Redigiria lá o texto da F-1 para o caderno da segunda-feira seguinte.— Mas não me comprometa, hein? — recomendou ele, na despedida.

E voltei para a “Cidade Eterna”, onde escrevi uma página inteira, que foi publicada no dia 31. Acho que nem teríamos brigado se a “Gazzetta dello Sport”, mais tradicional jornal esportivo da Itália, não tivesse reproduzido vários trechos da minha reportagem, com uma manchete gigantesca e escandalosa na primeira página: “Senna admite pela primeira vez: em 88 serei da McLaren”!

O episódio acabou valendo um puxão de orelhas de Ron Dennis em Senna e dele em mim. Tivemos uma conversa dura, no motor-home da Lotus, no GP de Portugal, e só fomos nos reconciliar em Báli, onde alguns pilotos e jornalistas passaram uma semana entre os GPs do Japão e da Austrália.

Encerrada a temporada, não me encontrei mais com Ayrton (voltei ao Brasil e deixei de cobrir a F-1). O que não me impediu de continuar torcendo à distância e reconhecendo que ele era, de fato, o melhor. Não fosse a Tamburello, Shumacher, o seu recorde de títulos seria de Ayrton Senna...

1266 visitas - Fonte: O Globo


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