OFF- 'Normal' e único, Alex se despede e deixa lacuna: 'O camisa 10 sumiu'

7/12/2014 09:04

OFF- 'Normal' e único, Alex se despede e deixa lacuna: 'O camisa 10 sumiu'

Craque encerra carreira neste domingo, não se vê diferente de ninguém, recorda momentos de sua trajetória e aponta o futsal como salvação para o futebol brasileiro

OFF- Normal e único, Alex se despede e deixa lacuna: O camisa 10 sumiu
Alex fala de decepção por ausência na Copa de 2002 e diz: "As derrotas me ajudaram bastante" (Foto: Fernando Araújo)

De calça jeans, camisa polo listrada e óculos pretos de armação grossa, Alex parece um sujeito normal. Sentado em uma mureta do estádio Couto Pereira numa tarde de segunda-feira, cansado de uma viagem, ele varre com os olhos a arquibancada vazia. Àquela altura, tentava prever um futuro bem próximo e só desejava que o último jogo da temporada, contra o Bahia, já não tivesse para o Coritiba o peso da luta contra o rebaixamento. Assim será. Neste domingo, a degola só ameaça os baianos. E o camisa 10 do Coxa estará ali, não sentado na mureta de calça jeans e tênis, mas de pé, no gramado, com uniforme e chuteiras. Pela última vez. Um domingo de festa e de adeus, com a torcida livre da angústia e pronta para celebrar o sujeito que, de tanto se achar normal ao longo de duas décadas, tornou-se único.

- Eu sei que não sou o melhor do mundo. Não me vejo diferente de ninguém. Deus me deu um dom que é jogar bola, mas isso não me faz melhor do que um torcedor, um deputado ou um gari – define Alex, que neste domingo, aos 37 anos, chega ao fim de uma estrada marcada por títulos, gols e sobretudo um jeito diferente de se apresentar dentro e fora do campo.

Sai dos gramados um jogador com uma etiqueta que não se vê mais por aí. “O camisa 10 sumiu”, avalia o próprio Alex, cravando o diagnóstico para logo em seguida receitar aos clubes um remédio simples: investir no futsal. Foi de lá que ele veio, é lá que ele enxerga a salvação do futebol brasileiro puro-sangue. Com a habilidade e a rapidez de raciocínio que a quadra exige, o curitibano forjou na grama uma trajetória com momentos brilhantes no Palmeiras e no Cruzeiro, virou estátua na Turquia e voltou ao Coxa para escrever o último capítulo de um enredo que não esconde suas decepções, como a ausência na lista de Felipão para a Copa de 2002:

- As derrotas me ajudaram bastante.

Se a carreira dá um livro, o que aconteceu longe dos campos vai muito além de notas de pé de página. O garoto de pouco estudo virou um adolescente autodidata, que foi matando a fome de conhecimento no convívio com os mais diferentes tipos de pessoas. Mergulhou na história de cada time que defendeu, desenvolveu uma inteligência pouco comum entre seus pares e uma visão crítica que, mais recentemente, fez dele um dos líderes do Bom Senso FC. Hoje Alex dá a entender que o movimento criado em 2013 para cobrar condições melhores no futebol brasileiro já cumpriu seu papel.

- Somos como o levantador do vôlei. Levamos a discussão para a presidente Dilma, para a Câmara dos Deputados. Daqui para frente são outras pessoas que têm de fazer algo, não temos poder de execução – pondera, revelando que chegou a defender uma greve geral, mas a ideia não foi adiante porque muitos jogadores temeram retaliações dos clubes, "com razão, porque acontece mesmo".

Ainda assim, Alex promete continuar debatendo a "realidade triste" do futebol nacional. E quando o árbitro apitar o fim de Coritiba x Bahia, ali por volta das 19h de domingo, haverá um mundo de possibilidades escancarado à sua frente. Dirigente? Comentarista? A princípio tudo parece interessante, mas a vontade de ser técnico não é segredo para ninguém. Só não vale assumir a nova função dando uma carteirada com o prestígio de atleta.

- Ter jogado futebol não me credencia para ser treinador. Em nada. Só vivi o lado de dentro, agora preciso viver o lado de fora.

E o torcedor do Coritiba, do Palmeiras, do Cruzeiro, do Flamengo, do Fenerbahçe ou da Seleção certamente estará satisfeito se Alex for, do lado de fora, o mesmo sujeito normal que foi do lado de dentro. Normal e único.

Confira a seguir a conversa de Alex com o GloboEsporte.com:



GloboEsporte.com: Você é um cara mais esclarecido, que discute assuntos fora do campo. Isso veio da sua família ou buscou conhecimento? Como surgiu esse Alex?

Alex:
Aos poucos. Mesmo porque meu pai e minha mãe não estudaram. Acredito que o que mais tenha me ajudado foi jogar futebol de salão na AABB, onde convivi com vários tipos de pessoas. Convivi com filhos de médicos, de advogados, com jogadores que vinham da mesma classe social que eu, e era uma enxurrada de conselhos. De todos os lados. Depois, quando subi para o time principal do Coritiba, vi jogadores de várias formas. Alienados, preocupados e interessados. E fui buscando, principalmente quando cheguei ao Palmeiras e não tinha o que fazer. Meus pais em Curitiba, minha namorada em Curitiba, e São Paulo me assustava, daí fui buscar algo para fazer. Era ler, estudar, conversar com gente de fora do futebol. Na verdade, fui sendo autodidata. Costumo dizer que sou metido mesmo. O assunto que eu não conheço, eu não falo, mas ouço muito para absorver e procuro sempre me aprofundar. Tinha situações que aos 20 anos eu queria falar e não podia. Hoje, aos 37 anos, eu posso falar.

Esse conhecimento colabora como atleta?

Acho que ajuda. Falando do futebol, quanto mais interessado for em qualquer tipo de assunto, mais aberta vai estar a cabeça dele para o que o treinador vai pedir. Já vi várias situações em que o treinador pediu coisa simples, e o jogador, por não ter escutado, por desinteresse ou por ser alienado, não entende uma situação simples.

Os clubes deveriam investir mais nessa formação?

O clube de futebol está pouco preocupado com a pessoa. De fazer um cidadão. O clube quer um robô. E esse robô tem que ir para dentro do campo e resolver os problemas dele. Se não resolver, a gente tira de lado e põe outro robô. Talvez a grande felicidade tenha sido jogar na ABBB, que formou vários atletas para Coritiba, Atlético-PR e Paraná, e esses jogadores fizeram relativo sucesso. Mas o mais legal é que são pessoas bem instruídas e preocupadas com o contexto geral. Os clubes de futebol estão pouco preocupados em formar um cidadão.



Isso é só no Brasil ou no exterior?

A gente não pode generalizar, mas lembrei o Cruzeiro, que tinha essa preocupação. Era uma exceção à regra. Mas, com certeza, tinha que ser mais corriqueiro. Muitos meninos vêm com 13 ou 14 anos de lugares distantes, com os pais delegando poderes aos clubes, e muitas vezes os clubes lavam as mãos, querendo apenas formar um jogador de futebol.

Acha que falta mais preparação aos jogadores que saem jovens do Brasil?

Falta, falta. Até pela formação. Eu, quando era criança, queria jogar no Coritiba, depois no Maracanã, no Mineirão. Quando era criança, via o Zico saindo de ônibus para ir ao Maracanã, o Sócrates saindo de ônibus para jogar no Morumbi. Nossas referências eram brasileiras, e hoje as referências são europeias. Hoje, você vê meninos que não querem jogar no Brasil. Daí, a gente pode discutir a legislação que permite a quem tem mais dinheiro levar o menino. Na formação, se perde muita coisa. Eu, no futebol de hoje, se chegasse como cheguei ao Coritiba, fatalmente não chegaria a jogar. Era muito franzino, não aguentava uma chegada de um menino mais forte. E hoje tem esse peso de ficar com o mais forte. Tanto que a gente está vendo sumir características que tinham de monte.



E o jogador com as suas características?

Sumiu. E não vai voltar. Aqui, no futebol brasileiro, não tem mais. Pode procurar em cada time no Brasil que não vai encontrar. Podemos procurar meninos de 14 anos e de repente tem alguém, mas no futebol de hoje, na primeira e na segunda divisão, não tem ninguém.

Qual o reflexo disso? O sumiço do camisa 10 pode alterar a forma de jogar?

Já mudou. Não temos mais o estilo brasileiro. Quem joga no estilo brasileiro? Depois que o Barcelona ganhou do Santos (por 4 a 0, na final do Mundial de Clubes de 2011), entrevistaram o Guardiola. Ele disse que faz aquilo que os brasileiros faziam lá trás. E nós copiamos o que os europeus faziam lá atrás. Hoje, com essa globalização, eles juntaram o que tinha de bom, que era essa parte tática e a determinação daquilo que o treinador pede, com a qualidade técnica. Nós diminuímos a qualidade técnica e, por natureza, não temos a condição mental de fazer o que os europeus fazem desde criança. Acredito que perdemos um pouco o caminho da história, mas é recuperável. É cíclico, tudo pode mudar. A gente é que tem que começar a discutir e fazer algo diferente com os meninos de 13, 14 anos para que, daqui a três ou quatro anos, tenhamos essas características novamente.

E como deve ser iniciada a recuperação?

Pela valorização do futsal, porque os grandes nomes do futebol brasileiro saíram das quadras. Antes havia a rua, mas não temos mais a rua, porque as cidades ocuparam. E sobrou a escola, mas a educação é péssima, e não temos na escola. O que restou é o futsal. O que nós, brasileiros, queremos como característica? O moderno, como todo mundo tem, ou agregar o futebol que tínhamos antes com a modernidade de hoje? É um trabalho longo, pois, em algum momento, nós nos perdemos.



Tem alguém pensando nisso?

Tem várias pessoas pensando. Pensar e pôr no papel é simples. A execução é que é complicada.

E entre os que têm as ferramentas para executar?

Acho que não estão pensando. Quem tem as ferramentas para pensar é a CBF, as federações e os clubes. Enquanto houver presidente de clube que não tem nem a condição de sentar e trocar uma ideia, eu acho complicado.



Em que momento está o Bom Senso?

Sempre brinquei que no Bom Senso somos como os levantadores no vôlei. Dificilmente vamos definir ou dar um bloqueio. O nosso objetivo é levantar as discussões, e chegamos a um ponto, no meu modo de ver, altíssimo. Levamos para a presidente Dilma, ainda antes das eleições, e vamos ver se ela mantém os pontos que nos colocou. Levamos para a Câmara de Deputados. O Romário era deputado e agora está no Senado. Vai levar para o Senado, e agora está na mão de quem tem esse poder. Nós temos o poder de discutir, de oferecer ideia. Sempre fomos muito abertos com presidente de clube, sindicato, federações... Conversamos com o presidente Marin (José Maria Marin, da CBF) e levamos para Brasília. Há várias coisas que, infelizmente, têm de ser feitas na lei. E tem coisas que são no futebol, o que precisa ser discutido com CBF, federações e sindicato dos treinadores.

Acha que esses setores estão sensibilizados? Tem gente para cortar essa bola?

Nos ouvindo e nos recebendo, fizeram isso de maneira espetacular. Agora, como vai funcionar, realmente só tenho expectativa de ver o que o vai acontecer.

E os protestos? Não serão mais feitos?

Já foram feitos. Já discutimos várias situações. Talvez fizéssemos uma greve geral, mas, num país continental como o nosso, como fazer? Tivemos duas oportunidades de fazer, mas vários recuaram. Eu era a favor, era meio xiita. Vários jogadores recuaram, e não sei se existe nova possibilidade.



Olhando para trás, o que deixa para o futebol brasileiro?

Eu não deixo nada. Deixo a minha satisfação, meu respeito e agradecimento. Devo tudo o que tenho ao futebol. Então meu agradecimento ao futebol é eterno. O que eu ofereci para as pessoas? Isso é muito individual. Já encontrei palmeirense que acha que não joguei nada, e respeito. E tem outros que acham que fui o maior jogador que eles viram na história do Palmeiras. A questão maior que eu enfrento é aqui no Coritiba. Muitos falam que sou ídolo do clube, aí vem outro que é antagônico e diz que nunca joguei nada aqui no Coritiba. Então isso é muito individual.

2246 visitas - Fonte: Globo Esporte


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