Muito antes de sonhar em jogar no Flamengo , que enfrentará o São Paulo pela final da Copa do Brasil , neste domingo (17), Matheus Cunha já usava as mãos para ajudar no sustento da família. Ainda adolescente, o goleiro trabalhou como garçom em Tupi Paulista, no interior de São Paulo.

Além de entregar os pedidos dos clientes em um carrinho de lanches que pertencia ao tio em uma praça, o jovem também dava expediente em um restaurante em que a mãe trabalhava como cozinheira.

"Vim de uma cidade onde todos se conhecem. Estudava de manhã, treinava de tarde e trabalhava à noite. Ganhava uma 'gorjetinha' até viver do futebol", disse ao ESPN.com.br .

O município de 15 mil habitantes, que fica a mais de 600 quilômetros da capital paulista, aliás, teve um papel importantíssimo na carreira do goleiro. Foram os conterrâneos que contribuíram para que o jovem pudesse fazer testes nos clubes.

"Minha família era bem humilde, mas a nossa cidade é pequena e todos se ajudam. Quando não tínhamos dinheiro para comprar uma chuteira ou uma passagem (de ônibus), minha mãe fazia uma rifa ou a cidade fazia uma vaquinha para ajudar", disse o arqueiro.

Para dar a primeira chuteira ao filho, Flávia, a mãe de Matheus, comprou uma batedeira elétrica e um liquidificador e vendeu os números das rifas pelas ruas.

"Isso nos deixa mais fortes e sabendo de onde viemos e o que passamos para chegar até aqui. São histórias para contar. Eu amo a cidade e todo mundo que me ajudou. Sou muito grato e, se não fosse por eles, provavelmente hoje não estaria aqui", contou o jogador.

Aos 13 anos, Matheus foi aprovado na base do São Paulo e mudou-se para Cotia para morar no alojamento do clube tricolor.

"A gente se via muito pouco. A primeira vez que o deixamos no CT voltei com o coração na mão e chorando. Fiz uma promessa que iria vê-lo e passei a trabalhar mais tempo só pra visitá-lo. Eu sentia muita falta, só nos víamos nas férias dele", recordou Flávia ao ESPN.com.br .

Apesar de sofrer com a saudade de casa por causa da distância, o garoto evoluiu no Tricolor. Foi titular em quase todas as categorias e convocado para as seleções de base.

Ida para o Flamengo

Em 2020, o jovem não chegou a um acordo para renovar o contrato com o São Paulo e deixou o Morumbi antes mesmo de estrear pela equipe principal. Cobiçado por Corinthians e Flamengo, ele optou pelo clube da Gávea.

"Nós tínhamos outro goleiro muito bom no time sub-20, com passagem pela seleção, mas entendemos que o Matheus era um atleta de altíssimo nível. Os diretores entenderam que valia a pena ter os dois. A gente não mediu esforços, e ele acreditou no nosso projeto", disse Luiz Carlos, gerente geral da base rubro-negra, ao ESPN.com.br .

Rogério Ceni, ídolo do São Paulo e comandante do time profissional do Flamengo à época, teve um papel importante na chegada de Matheus. Danilo Augusto, preparador físico do treinador, havia trabalhado com o goleiro na base.

"A gente conversou com o Danilo, que chancelou a contratação e deu boas referências. Eu acredito que, naturalmente, o Danilo deva ter conversado com o Rogério", afirmou Luiz.

Rapidamente, o novato passou a jogar na equipe sub-20 e subiu para o elenco principal. No ano passado, estreou no time profissional e fez algumas partidas, mas virou titular absoluto após a chegada do técnico Jorge Sampaoli, superando uma forte concorrência de Santos e Rossi.

"Tenho o privilégio de trabalhar com duas pessoas excelentes. Aprendo todos os dias com eles e não tenho vergonha de fazer perguntas. Eles me dão dicas e é algo muito gratificante".

Fã de Júlio César (ex-Flamengo) e Rogério Ceni (ex-São Paulo) na infância, Matheus se inspira atualmente em Ederson, titular do Manchester City e da seleção brasileira.

"É o melhor goleiro da atualidade pela capacidade de jogar com as mãos e os pés. Estudo muito o Ederson para aprender. É seguir trabalhando para chegar aonde ele está. Costumo ver os jogos do City porque gosto muito do Guardiola. Quando o Sampaoli veio, me senti em casa. É o estilo de jogo que eu gosto e isso me fez também evoluir bastante".

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Destaque na temporada, Matheus foi chamado pelo técnico Ramon Menezes para os amistosos da seleção olímpica. Titular na derrota por 1 a 0 para o Marrocos , o arqueiro foi um dos destaques do time brasileiro.

"É um sonho. Desejo estar na disputa do pré-olímpico no ano que vem e em Paris na Olimpíada . Vestir a camisa da seleção é gratificante e o andar mais alto que um atleta pode atingir. Espero que possa continuar atuando bem para poder voltar".

Após alguns anos, a aposta feita no arqueiro deu resultado. "O Matheus sabe jogar com os pés, tem dupla nacionalidade e é muito maduro para a idade. É óbvio que as coisas aconteceram até mais rápido do que o esperado, mas não é nenhuma surpresa ele estar jogando", disse Luiz Carlos.

Para conquistar o primeiro título atuando, Matheus precisará vencer justamente o antigo clube na decisão.

"Fui para o São Paulo muito jovem atrás de um sonho e não tive o privilégio de poder atuar no profissional. Quem abriu as portas foi o Flamengo. Sou muito grato por tudo que o Flamengo fez por mim. Sou grato ao São Paulo também pelo começo. Se não fosse por ele, talvez também não estivesse aqui. Mas hoje eu amo o Flamengo e defendo esse escudo tão pesado. Esperamos fazer uma grande final e sairmos campeões", finaliza.

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