O ano era 1950. E o jovem goleiro Alberto Ferreira, do Botafogo da Paraíba, se preparava para pegar a estrada rumo ao Rio de Janeiro. Com 18 anos, ele deixou tudo para trás em sua terra natal. A missão principal era fazer testes no Flamengo e se tornar goleiro profissional de seu time do coração. O garoto de Alagoa Grande só não sabia ainda que falharia no seu projeto de ser jogador de futebol e que tempos depois se transformaria em um dos maiores fotógrafos esportivos do mundo, autor de algumas das fotos que melhor sintetizaram a genialidade do rei Pelé (tanto no Santos como na Seleção Brasileira) e de craques como o botafoguense Garrincha.
Dias depois da sua chegada à Cidade Maravilhosa, Alberto Ferreira foi até à Gávea justamente para participar de uma peneira no Flamengo, clube que desde cedo era apaixonado e principal responsável pelo seu amor por futebol. Nervoso, entrou em campo. E durante o teste levou nada menos do que três “frangos”, sendo imediatamente descartado do time. Sem dinheiro, aceitou uma sugestão de um primo fotógrafo em João Pessoa e começou a ser fotógrafo no Rio, iniciando o que seria uma carreira de sucesso.
A história acima é contada pelo filho (carioca) Carlos Ferreira, cinco anos após a morte do pai, que morreu em 2007 aos 75 anos de idade. Em João Pessoa para lançar a mostra “Além da Bicicleta” (veja aqui galeria de fotos sobre o evento), com o objetivo de difundir o trabalho fotográfico do pai entre seus conterrâneos, Carlos contou estas e outras histórias. E explicou que fazer o pai conhecido em sua terra natal lhe dá um orgulho especial.
- Meu pai é extremamente conhecido no mundo, classificado pela Casa Europeia de Fotografia, na França, como um dos dez maiores fotógrafos do mundo no século 20. Ele é também “relativamente conhecido” no Brasil, mas poucos sabem que ele era um paraibano apaixonado por sua terra. Esta mostra tem o objetivo de mudar esta realidade – explica Carlos, registrando que enquanto vivo Alberto manteve a tradição de sempre visitar, ao menos duas vezes por ano, a sua terra.
Depois de uma rápida passagem pela Revista da Semana, Alberto Ferreira foi para o Jornal do Brasil, onde fez carreira e por mais de 25 anos chefiou a equipe de fotógrafos do jornal. Ao todo, cobriu seis Copas do Mundo e três Jogos Olímpicos, além de acompanhar a temporada da Fórmula 1 de 1972, quando Émerson Fittipaldi conquistou seu primeiro título mundial na categoria. Foi ele também o único fotógrafo do mundo a registrar numa sequência de fotos a única "queda olímpica" de Nadia Comaneci, nas Olimpíadas de Moscou em 1980.
Mas foi mesmo com Pelé que Alberto Ferreira conseguiu suas fotos mais famosas. Ainda no final da década de 1950, ele começou a fotografar jogos do rei sempre que o Santos ia jogar no Maracanã. E aqueles não eram raros. Em 1961, fotografou o jogador testando a bola da Copa do Mundo do Chile, que aconteceria um ano depois, e naquele momento ficou amigo do santista. Em 1962, conseguiu sua primeira grande foto.
Pelé se machucou no jogo contra a Tchecoslováquia e saiu de campo carregado por um policial que fazia a segurança do estádio. Seria o último jogo do ídolo naquele mundial. E um ano depois Alberto Ferreira ganhava o Prêmio Esso de Fotojornalismo pelo registro do momento exato da contusão. A foto ganhou uma legenda que registra a tensão do momento: “O rei se curva à dor e o país inteiro sentiu”.
Alguns anos depois, em 1965, o maior dos momentos. A foto que ficou conhecida como “a mais importante do jornalismo esportivo do Brasil” e que segundo Carlos Ferreira foi classificada pelo próprio Pelé como a síntese de sua carreira. É o momento exato de uma bicicleta de Pelé, em pleno Maracanã, que resultou em gol do Brasil contra a Bélgica (é esta foto inclusive que inspira o nome da mostra).
A foto é tão emblemática que, em 2002, durante a Copa do Mundo do Japão e da Coreia, ela estampou os cartões de crédito expedidos em todo o mundo por um dos patrocinadores da Fifa. E em 2006 virou outdoors gigantes em Berlim, como forma de divulgação da Copa da Alemanha.
Sobre tudo isto, o filho Carlos Ferreira fala emocionado:
- Quando estava no Maracanã, meu pai assistia ao jogo pelo visor de sua câmera. Naquele dia estavam mais de 100 fotógrafos, mas ele foi o único que conseguiu aquele instante magnífico. Para ele, fotografar era uma arte – descreve.
Para alguns momentos depois, em tom bem mais descontraído, falar aos risos:
- Graças a Deus ele levou três frangos e virou fotógrafo. Um dos melhores do Brasil. Autor de uma das mais famosas fotos já produzidas por um brasileiro.
Além de Pelé, Alberto fotografou também nomes como Garrincha, o gênio botafoguense das pernas tortas, imortalizando o exato momento de um gol do ponta pelo Botafogo. Foi em 1961, contra o América, pelo Campeonato Carioca.
Alberto era tão completo, que nem mesmo se resumiu ao esporte, sendo também o dono de um dos maiores acervos da construção de Brasília, na década de 1960.
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