Cauan Emanuel Gomes Nunes havia dormido pouco mais de duas horas quando acordou assustado no alojamento do Ninho do Urubu. Ainda que fosse pleno verão no Rio de Janeiro naquele 8 de fevereiro de 2019, o quarto costumava ser muito frio por causa do ar-condicionado, a ponto de o jovem jogador da base do Flamengo precisar de cobertor. Por isso, ele estranhou quando sentiu um forte calor e ouviu gritos desesperados dos colegas no meio do que descobriria ser um incêndio. "Só percebi que o fogo estava alto depois. Eu fui atrás da janela, porque era a única solução que tinha. E aí comecei a cambalear e tentar quebrá-la, mas não conseguia. Nisso, o monitor me ajudou depois que dei um pisão. Ele jogou uma pedra e quebramos", disse Cauan, ao ESPN.com.br. A ação salvou a vida do atacante, do goleiro Francisco Dyogo Bento Alves e do zagueiro Jhonata Ventura, que foram para os alojamentos do time profissional antes de serem encaminhados para hospitais. No entanto, outros dez garotos perderam a vida naquela madrugada.
Os nomes dos colegas mortos e a data do incêndio no Ninho do Urubu viraram uma tatuagem no braço de Cauan. "Vai ficar para sempre na minha vida, né? Foi uma coisa que não tem como esquecer. É um momento triste, mas precisamos superar. A gente tem que orar, pedir a Deus proteção para as famílias que perderam seus filhos, que eram muito importantes". Depois de passar três dias internado, Cauan foi para a casa da família em Fortaleza por cerca de dois meses. "Para falar a verdade, não tive mais vontade de voltar (ao Flamengo). Eu acho que eu fiquei com aquele receio, mas tinha que correr atrás do sonho não podia desistir". No retorno à Gávea, ele disse que teve acompanhamento psicológico no clube. "Eles me deram no começo me deram suporte nos treinos com uma psicóloga, mas eu não quis. Achava que estava tudo bem para voltar a jogar, mas não estava". play 0:40 Sobrevivente do Ninho diz que errou ao não continuar com ajuda psicológica: 'Por isso saí do Flamengo' Em entrevista ao ESPN.com.br, Cauan Emanuel revelou com ose sentiu após o incêndio no CT O atacante retornou bem ao futebol e até assinou o primeiro contrato profissional quando completou 16 anos. No entanto, não conseguiu manter a cabeça boa por muito tempo.
"Depois de um tempo eu comecei a não jogar, achar que o problema era o clube, mas às vezes acho que era eu. A minha ação psicológica resultou na minha saída do Flamengo". "Eles falaram que estavam incomodados por eu não jogar o Brasileiro. O problema é que se jogasse, depois não poderia ir para outro clube. Tinham outros times procurando por mim e fiz um acordo", explicou. Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por CAUAN GOMES (@cauangomes.07) Como não estava jogando com muita frequência, o atacante deixou a Gávea na metade de 2021 e foi embora para a base do Fortaleza. Relacionado Dispensado do Flamengo pelo telefone, sobrevivente de incêndio no Ninho tenta realizar sonho fora do futebol 12h Juliana Cortopassi e Vladimir Bianchini Como estão sobreviventes de incêndio no Ninho do Urubu cinco anos após tragédia? 2h Juliana Cortopassi e Vladimir Bianchini
"Fiquei com a minha família e as pessoas que eu amava para poderem me apoiar. Quando eu cheguei fui destaque em competições e pude contribuir com o clube. Tive boas experiências e um crescimento". Neste período, Cauan virou pai de um menino e disputou vários torneios. No final do ano passado, o contrato com o Fortaleza se encerrou e não foi renovado. Por isso, ele procura um novo clube para seguir a carreira, aos 19 anos. "Consigo enxergar que foi um erro meu não ter continuado no suporte psicológico. Hoje eu escuto mais e sei o que devo fazer. Estou bem e treinando para uma nova oportunidade. Não importa qual seja, eu vou agarrá-la".
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