- Eu sei que todos vocês gostariam de estar sentados aqui no meu lugar. Abel Ferreira causou polêmica com essa declaração direcionada aos jornalistas em uma entrevista coletiva do Palmeiras em setembro . Mal deve saber o técnico português que a provocação que soa hoje como impossível já aconteceu no Brasil. "O Apolinho aterrissa no Fla", estampou o jornal O Globo no dia 12 de setembro de 1995. Apolinho era o apelido que o jornalista Washington Rodrigues ganhou nos tempos de repórter de campo, por causa do microfone que usava similar ao dos astronautas da famosa Missão Apollo 11, que levou pela primeira vez o homem à lua em 1969.
Em 1995, Apolinho já era um consagrado comentarista esportivo da Rádio Globo e pai de expressões que caíram no gosto popular, como, por exemplo: "geraldinos e arquibaldos" (torcedores da antiga geral e arquibancada do Maracanã, respectivamente); "mais feliz do que pinto no lixo"; "batom na cueca"; "briga de cachorro grande"; "cuspir marimbondos"; "parir um porco-espinho" etc. E uma coisa que ele não fazia questão de esconder era o seu clube do coração: o Flamengo .
Ao sentar-se à mesa, ouviu que o nome do novo técnico do Flamengo estava escrito num papel embaixo do prato. E lá ele leu: Washington Rodrigues. "Ele ficou impactado com a ideia. E imediatamente nós passamos a desenvolver o tema daquilo que ele não tinha muita profundidade: a parte de campo, a parte tática, de desenvolvimento dos treinamentos e tudo mais. E contratamos profissionais que supriam alguma deficiência que por ventura poderia acontecer no início do trabalho dele" - explicou Kleber, que pela primeira vez não precisava negociar com outro clube para uma contratação, e sim com uma rádio.
A alta expectativa sobre o trabalho, porém, durou pouco tempo. No Campeonato Brasileiro, Apolinho não conseguiu tirar o time da lanterna do Grupo A no fim do primeiro turno, e no segundo levou o Flamengo só ao sétimo lugar entre os 12 da chave, não passando nem perto de conquistar uma vaga na semifinal. Restava, então, a Supercopa da Libertadores como a última chance do tão sonhado título no ano do centenário.
Apolinho ficou tão empolgado que protagonizou uma cena inesquecível para quem estava no vestiário do estádio José Amalfitani: "O vestiário estava molhado, e na entrada ele deu um peixinho. Sabe, aquele que o pessoal do vôlei faz muito? Ele fez isso, todo mundo: "Êêê" (risos) - lembrou Kleber Leite.
No segundo tempo realmente foi uma pressão muito grande, mas não foi possível. Ali foi uma grande frustração. Eu, com 21 anos, confesso que fiquei muito mal. Fiquei praticamente uma semana sem falar com ninguém. Eu fui criado dentro da Gávea, tenho uma identificação muito forte com clube, e no ano do centenário queria dar algo de presente para a torcida. Faltou só um gol para o Flamengo do Apolinho levar aquela decisão para os pênaltis. Numa época em que a imprensa ainda tinha acesso ao vestiário, os repórteres acompanharam de perto a desolação de Washington Rodrigues, que foi o último a ir embora nesse dia.
Atualmente na Rádio Tupi e com o canal no YouTube "Cheguei Podcast do Garotinho", José Carlos Araújo lembra até hoje das reclamações de Apolinho como técnico, mas acredita que ele não se arrependeu: "Ele dizia assim: 'Ser treinador de futebol, eu não imaginava que seria tão difícil'. E o que é mais difícil? Administrar os problemas pessoais. Cada dia tinha uma série de problemas para ele resolver que era extracampo. Ele me falou: 'Tomo o meu tempo quase todo administrando probleminhas pessoais. É problema de fulano que brigou com a mulher, o outro que está com o aluguel atrasado'" - afirmou Kleber Leite, que hoje é dono de uma agência de marketing esportivo chamada "Klefer" e acredita ser preciso mais uma vez "pensar fora da caixa" no futebol brasileiro.
Comentários do Facebook -